Neste domingo, fui interpelado pela notícia de que o Conselho Nacional de Justiça está empenhado em divulgar as peças da campanha "Crack nem pensar", do Grupo RBS. Tema de minha dissertação de mestrado, a campanha é um triste exemplo de como é possível, por meio de uma inervenção desastrada, aumentar ainda mais o problema que deseja-se combater. Suas tristes imagens ampliam em muito o estigma e o preconceito sobre usuários de crack.

Enviei um breve texto manifestando minha indignação à ouvidoria do CNJ. Segue abaixo:

"Dedico-me ao trabalho preventivo e de recuperação de pessoas que usam drogas há pelo menos 10 anos. Antes disto, eu mesmo fui usuário abusivo por mais 10 anos. Ao todo, são 20 anos dedicados, de uma ou outra forma, ao universo das drogas. A campanha disparada pelo Grupo RBS é uma das piores iniciativas já desenvolvidas para lidar com este tema, tanto no Brasil quanto fora dele. Se estivéssemos falando de uma campanha de prevenção a Aids, nestes mesmos moldes, teríamos um escândalo de proporções internacionais, e o Brasil certamente teria suas orelhas puxadas, tanto por organismos internacionais, quanto pelo movimento social que se reúne em torno do tema da Aids. A campanha em questão, que agora é tristemente replicada pelo CNJ, é pródiga, não em prevenir o uso de crack, mas em ampliar o preconceito e o estigma, que são parte importante do problema. Insisto: aumentar o estigma e o preconceito sobre pessoas que usam crack não ajuda a diminuir o uso, pelo contrário: amplia a exclusão social, amplia a culpa, amplia a ojeriza que a sociedade sente por estas pessoas. Amplia o medo, a sensação de que estas pessoas são perigosas. Trata-se de uma das piores campanhas de prevenção ao uso de drogas já realizadas neste país. E o CNJ, ao invés de contribuir para a reflexão sobre os modos de se fazer prevenção, simplesmente amplia a potência de tal campanha. Triste, muito triste."

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